segunda-feira, 25 de março de 2013

O Instituto Millenium, suas “aulas” de jornalismo e as lembranças

limpinho e cheiroso

Kamel, da Globo, e Serra durante debate eleitoral: mídia conservadora perdeu no campo democrático.

Organização que une empresários, imprensa e oposição ao governo lembra cenário do golpe de 1964. Seu poder de propagar intrigas e más notícias, porém, não tem sido capaz de superar a solidez e os resultados do projeto político em vigor.

Laurindo Lalo Leal Filho, via Revista Brasil Atual

O economista Cristiano Costa foi recebido em fevereiro pelo pessoal do Grupo A Tarde, em Salvador. A companhia de comunicação, que tem provedor e portal na internet, agência de notícias, jornal impresso, emissora de FM, gráfica, reuniu seus profissionais para servirem-se de uma palestra da série “Millenium nas Redações”. Blogueiro e professor de uma universidade capixaba chamada Fucape Business School, Costa é também colaborador cativo do Instituto Millenium, articulador desses eventos destinados a “aprimorar a qualidade da imprensa no Brasil”.

A base de sua explanação são seus artigos reproduzidos no site do instituto, em que critica duramente a política econômica do governo e ataca sem rodeios o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Em um deles, cita o programa Minha Casa, Minha Vida como um dos responsáveis por inflacionar o setor imobiliário. Isso num ambiente em que até os preços de imóveis de alto padrão dispararam. As pessoas estão mais seguras no emprego e foram comprar, a queda dos juros levou mais gente a ter acesso a crédito, ou mais gente a tirar dinheiro de aplicações financeiras para investir em imóveis. Há muitos fatores em jogo, mas lá vai o programa federal destinado a famílias de baixa renda pagar o pato da especulação.

Outras redações de jornais e revistas foram “brindadas” pelo Millenium com palestras sobre assuntos variados, da reforma do Judiciário à assustadora “crise econômica”. O currículo dos palestrantes, colaboradores do instituto, explica o objetivo real das palestras: consolidar no meio jornalístico o papel oposicionista da mídia brasileira.

Há algum tempo os ambientes de redação eram conhecidos por ter profissionais críticos, independentes, e o direcionamento da informação era resultado da sintonia dos editores com os donos dos veículos. Não era incomum a conclusão do jornal ou da revista acabar em atrito entre repórter e superiores. Agora, os donos dos veículos preferem formar “focas” que já cheguem às redações comprometidos com suas crenças.

Essas crenças, recheadas de interesses políticos e econômicos, vêm sendo difundidas de maneira afinada pelos meios de comunicação reunidos no Millenium. Resultado concreto desse trabalho pôde ser visto neste início de ano. Três assuntos, alardeados como ameaças ao País, ocuparam as manchetes dos grandes jornais e foram amplificados pelo rádio e pela tevê: apagão, inflação e crise na Petrobras.

Além do noticiário parcial, analistas emitiam previsões catastróficas. Como elas não se confirmavam, o assunto era esquecido e logo substituído por outro. Em 8 de janeiro, o jornal O Estado de S.Paulo estampou na capa: “Governo já vê risco de racionamento de energia”. Um dia antes a colunista da Folha de S.Paulo Eliane Cantanhêde chamava uma reunião ordinária, agendada desde dezembro, de “reunião de emergência” do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico convocada às pressas por Dilma para tratar do risco de racionamento. Diante da constatação de que a reunião nada tinha de extraordinária, a Folha publicou uma acanhada correção. Como de costume, o tema foi sendo lentamente deixado de lado. O risco do “racionamento” desapareceu.

Pularam para o “descontrole” da política econômica e a ameaça de um novo surto inflacionário. “Especialistas” tentavam, a partir dos índices de janeiro, projetar uma inflação futura capaz de desestabilizar a economia. Aproveitavam para crucificar o ministro Mantega, artífice de uma política que contraria interesses dos rentistas nacionais e internacionais: a redução dos juros bancários está na raiz da gritaria.

Não satisfeitos, colocaram a Petrobras na roda, responsabilizando a “incapacidade administrativa” dos dirigentes da empresa pela redução dos dividendos pagos aos acionistas. Sem considerar que, dentro da estratégia atual de ação da Petrobras, os recursos de parte dos dividendos retidos passaram a contribuir para o desenvolvimento do país na forma de novos investimentos.


Variações de uma nota só
Aparentemente isoladas, essas versões jornalísticas são, na verdade, articuladas a partir de ideias comuns que permeiam as pautas dos principais veículos. No site do Instituto Millenium elas estão organizadas e publicadas de maneira clara. O Millenium diz ter como valores “liberdade individual, propriedade privada, meritocracia, Estado de direito, economia de mercado, democracia representativa, responsabilidade individual, eficiência e transparência”. Faz lembrar a ex-primeira-ministra britânica Margareth Thatcher, que chegou a dizer que só o indivíduo existe, a sociedade é ficção.

Fundado em 2005, o Millenium foi oficialmente lançado em abril de 2006 com o apoio de grandes empresas e entidades patronais lideradas pela Editora Abril e pelo Grupo Gerdau. Trata-se de uma liderança significativa, pois reúne uma empresa propagadora de ideias e valores e outra produtora de aços, base de grande parte da economia material do País. A elas juntam-se a locadora de veículos Localiza, a petroleira norueguesa Statoil, a companhia de papel Suzano, o Grupo Estado e a RBS, conglomerado de mídia que opera no sul do Brasil. A Rede Globo, como pessoa jurídica, não aparece na lista, mas um de seus donos, João Roberto Marinho, colabora.

Essa integração entre empresas de mídia e empresários faz do Millenium uma organização capaz de formular e difundir programas de ação política em larga escala, com maior capacidade de convencimento do que muitos partidos políticos. Com a oposição partidária ao governo enfraquecida, ocupa esse espaço com desenvoltura.

Apesar do apego declarado à democracia, alguns dos colaboradores não escondem o desejo de combater o governo de qualquer forma. É o que está explícito na fala de outro de seus colaboradores, o articulista Arnaldo Jabor, quando num dos eventos promovidos pelo instituto disse: “A questão é: como impedir politicamente o pensamento de uma velha esquerda que não deveria mais existir no mundo?”

Essa articulação faz lembrar a de organismos privados como o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad), fundado em 1959, e o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipes), nascido em 1961. Ambos uniram empresários e mídia conservadora na formulação e divulgação de ideias que impulsionaram o golpe de 1964.

“Ipes e Ibad não eram apenas instituições que organizaram uma grande conspiração para depor um governo legítimo. Elaboraram um projeto de classe. O golpe foi seguido por uma série de reformas no Estado para favorecer o grande capital”, lembra o pesquisador Damian Bezerra de Melo, da Universidade Federal Fluminense (UFF).

No cenário atual, de decadência do modelo neoliberal e de consolidação de políticas desenvolvimentistas no Brasil, o Millenium seria um instrumento ideológico para dar combate a esse processo transformador. “Nos anos de 1990 ocorreu a disseminação da ideologia do pensamento único, de que o capitalismo triunfou, o socialismo deixou de existir como projeto político”, lembra a historiadora Carla Luciana da Silva, da Universidade do Oeste do Paraná.

“Quando surgem experiências concretas que podem desafiar essas ideias, aparece em sua defesa uma organização como o Millenium 
para manter vivo o ideal do pensamento único.”

Memórias de um golpista: Lincoln Gordon com o general Castelo Branco. A CIA patrocinou a ação de 1964.

A difusão dessas ideias não é feita por meio de manifestos ou programas partidários, como observa a pesquisadora. “É muito difícil pegar uma revista como a Veja ou um jornal como a Folha de S.Paulo e conseguir visualizar os sujeitos que estão produzindo as ideias defendidas ali. Cria-se uma imagem do tipo ‘a’ Folha, ‘a’ Veja, como se fossem sujeitos com vida própria. É uma forma de não deixar claro em nome de que projeto falam, como se falassem em nome de todos.”

Contra as versões, fatos
Conhecendo as ações do instituto e seus personagens fica mais fácil compreender como certos assuntos tornam-se destaque de uma hora para outra. A presença nos quadros do instituto de jornalistas e “especialistas” com acesso fácil aos grandes meios de comunicação leva suas “notícias” rapidamente ao centro do debate nacional. E fica difícil contra-argumentar com colaboradores do Millenium, não pela qualidade de seus argumentos, mas pela força de persuasão dos veículos pelos quais difundem suas ideias.

Como retrucar, com igual alcance, comentários de Carlos Alberto Sardenberg, na CBN, de Ricardo Amorim, na IstoÉ, na rádio Eldorado e no programa Manhattan Connection, da GloboNews, de José Nêumanne Pinto, no Estadão e no Jornal do SBT, de Ali Kamel, diretor de jornalismo da TV Globo, entre tantos outros?

Não é mera coincidência a preferência dos integrantes do Millenium pela subordinação do Brasil aos grandes centros financeiros internacionais e sua ojeriza diante das relações harmônicas entre governos latino-americanos. Trata-se de uma tentativa de ressuscitar um projeto político implementado durante a ditadura que só passou a ser confrontado, ainda que parcialmente, a partir de 2003, com a posse do governo Lula.

Mas parece não haver espaço para uma hipótese golpista, apesar do já citado dilema de Jabor. Para a professora Tânia Almeida, da Unisinos de São Leopoldo (RS) e diretora de relações públicas da Secretaria de Comunicação do Rio Grande do Sul, um dos ganhos da crise política de 2005, com a questão do chamado “mensalão”, foi ter forçado análises e estudos em busca de explicações de como o então presidente Lula conseguiu suportar tanta notícia negativa e manter elevados índices de aprovação.

“Não era só carisma. Desde 2003, havia uma gestão de governo em funcionamento. Não existia somente aquilo de que os jornais e revistas tratavam, não era só escândalo. Outra proposta política estava acontecendo”, observa Tânia. Para a professora, os avanços sociais alcançados não permitem crer em crise que leve a uma ruptura institucional. “O Millenium é um agente articulador, social, político, que pode fomentar e aquecer debates, mas não teria potencial para causar uma crise nos moldes de 1964. O poder de influência da mídia ficou relativizado desde 2006 em função dessa política que chega lá na ponta e inclui quem estava fora.”

Damian Melo, da UFF, tem visão semelhante, mas com um pé atrás: “O Millenium não possui hoje estratégia golpista. Quer emplacar seu projeto, e isso pode ser pela via eleitoral mesmo. Muito embora nossa experiência nos diga que é melhor ficarmos atentos.”

Colaborou Rodrigo Gomes
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O Ibad como modelo
Mauro Santayana
O Instituto Brasileiro de Ação Democrática (Ibad) foi a mais descarada forma de intervenção norte-americana no processo político brasileiro, mas não a primeira. No governo Dutra (1946–1951), o grande desembarque econômico norte-americano no Brasil, os ianques agiam com desenvoltura na vida brasileira.
 Nessa fase, denominada pelo historiador Gerald K. Haines como “americanização do Brasil”, editoriais dos grandes matutinos cariocas chegaram a ser redigidos na embaixada dos Estados Unidos.

O Ibad nasceu da esperteza de um negocista, Ivan Hasslocher. Ele criou a agência de publicidade Incrementadora de Vendas Promotion para servir como operadora do sistema e levantou milhões de dólares da CIA e de empresas norte-americanas, a fim de eleger parlamentares de direita – já no fim do governo Juscelino, em 1959. Após a renúncia de Jânio Quadros, em 1961, passou a atuar descaradamente.

Clandestinamente, o instituto financiou, com a cumplicidade do deputado de extrema-direita João Mendes, a formação de sua própria bancada de parlamentares comprometidos com sua orientação ideológica. O embaixador norte-americano no Brasil naquele período, Lincoln Gordon, confessou, depois, que a CIA fora a principal fonte pagadora de Hasslocher.

Uma CPI foi instalada em 1963 para investigar o instituto, mas não pôde ir adiante. Seus membros mais ativos – Eloy Dutra, José Aparecido de Oliveira, João Dória, Benedito Cerqueira e Bocaiuva Cunha – foram cassados em 1964. Outro membro ativo, Rubens Paiva, seria assassinado pelo DOI-Codi em 1971.
Jango foi corajoso ao suspender as atividades do Ibad duas vezes, por 90 dias, até que a Justiça mandou fechar a instituição. Mas já era tarde. Hasslocher e seus assalariados continuaram a atuar clandestinamente, em associação com o Ipes. O Ibad tinha também em sua folha de pagamentos jornalistas, sem falar na adesão “gratuita” dos donos dos grandes jornais – com exceção do Última Hora.

domingo, 24 de março de 2013

Bolsa Familia atinge 25% da população

BRasil Laico

Governo 'exporta' programas sociais
A estimativa é que 65 países já tenham se inspirado em ideias brasileiras, como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida

Essa cópia detalhada do projeto brasileiro vai da urbanização das favelas até a forma dos contratos de financiamento, e conta com uma ajuda de peso: a ex-presidente da Caixa Econômica Federal Maria Fernanda Coelho vai ao país uma vez por mês dar assessoria técnica aos venezuelanos. Ela atende a um pedido do próprio ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Apesar de recente, o Minha Casa, Minha Vida já entrou na pauta de cooperação externa do Brasil. Hoje há seis países africanos e latino-americanos que recebem ajuda brasileira para implantá-lo. Um deles é a Nicarágua, onde Daniel Ortega também enfrentou uma dura reeleição este ano. Seu chanceler, Samuel Santos, esteve no Brasil em julho tratando justamente dos projetos de cooperação.

"O Brasil é visto hoje como um laboratório de políticas sociais, tanto pelos países que vêm pedir cooperação como pelos desenvolvidos, que nos pedem para fazer mais projetos", justifica o presidente da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), embaixador Marcos Farani. "Temos hoje projetos de cooperação com 65 países. Eu diria que em todos existe algum programa social."

O próprio governo brasileiro oferece aos vizinhos e aos africanos suas experiências sociais. O Segundo Tempo, do Ministério dos Esportes, recentemente alvo de denúncias que mostraram o programa como um duto para desvio de dinheiro através de organizações não-governamentais de fachada, virou estrela das propostas de cooperação esportiva. O programa já foi iniciado em cinco países - entre eles Angola e Moçambique - e há outras propostas aguardando a resposta brasileira.

Transferência de renda. Um dos projetos mais pedidos é o fiador de boa parte da popularidade de Lula, o Bolsa Família. De acordo com Farani, os programas do Ministério do Desenvolvimento Social, com ênfase na transferência de renda para famílias pobres, só perdem para os da Agricultura, que vão desde o desenvolvimento de tecnologias pela Embrapa até os de compra local, passando por financiamento de agricultura familiar e alternativas para o produção de biocombustíveis.
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,governo-exporta-programas-sociais-,812785,0.htm

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e segue os links de onde tirei as informações acima

População brasileira chega a 193.946.886 habitantes em julho de 2012
http://noticias.terra.com.br/brasil/populacao-brasileira-chega-a-193946886-habitantes-em-julho-de-2012,e961dc840f0da310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html
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Bolsa Família terá R$ 23,9 bilhões em 2013
De acordo com a ministra, o programa atende um universo de 50 milhões de pessoas e conseguiu reduzir em 89% a extrema pobreza no País
http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2013-03-18/bolsa-familia-e-um-programa-barato-diz-ministra.html

D. Joana devolve o cartão do Bolsa Família

Publicado em 24/03/2013


E o que ela disse da Globo ? Quá, quá, quá !

O Conversa Afiada republica comentário que recebeu do amigo navegante Ary:


Ary


Em 2009 eu participei de um seminário em BH sobre os ODM (http://www.portalodm.com.br/) .

A então prefeita de Pombal-PB, contou a história de dona Joana. Um dia, dona Joana encontrou a prefeita e disse que queria devolver o cartão do Bolsa Família.

A prefeita perguntou o motivo. Ela: não preciso mais. Com o dinheiro do cartão fui comprando pintinhos. Hoje tenho 600 galinhas, vendo ovos e ganho mais do que o cartão me dá.

Disse mais, a dona Joana: “Esse cartão o Lula emprestou para quem precisa. Agora eu não preciso mais eu quero devolver para que ele dê para outra pessoa”. A prefeita disse: Você vai devolver, mas vai devolver no rádio.

Dito e feito. Depois de algum tempo, quase 300 pessoas devolveram o cartão, miradas no exemplo de dona Joana. O próprio Ministério do Desenvolvimento Social achou que algo estava errado e foi verificar o por que de tantas devoluções.

O bonito vem agora: Um repórter da Globo se bandeou para Pombal. Foi atrás de algum furo no programa. Foram procurar a dona Joana. Ao ver o carro da Globo, dona Joana tascou: “se vocês vieram aqui para falar mal do Lula podem ir embora já!”

A mulher brasileira faz uma revolução. Chauí conta uma história do Bolsa Família.

Publicado em 26/12/2010

conversaafiada 

Extraído da entrevista da professora Marilena Chauí à revista “Caros Amigos” de dezembro

“Eu tenho uma colega, socióloga, que viajou pelo Brasil inteiro fazendo a pesquisa em torno do Bolsa Família (*). O Bolsa Família produziu uma desestruturação da família, porque ele produziu a perda de lugar masculino e a presença forte da figura feminina. Isso mudou as relações de poder dentro do interior da família, isso mudou o lugar da mulher nas pequenas comunidades e pequenas sociedades.


E isso produziu o seguinte efeito: as mulheres do Bolsa Família foram capazes de usar o recurso de tal maneira que sempre houve uma sobra … e elas se reuniram  … formaram cooperativas … foram fazer artesanato, foram fazer corte e costura.


Há mil e uma atividades que as mulheres estão fazendo no Brasil inteirinho e isso mudou a relação com os filhos, porque, para fazer isso, elas compreenderam com clareza o significado do FUNDEB (http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12407&Itemid=726) e a ida da criança para a escola. E o FUNDEB, através do PRONAF (http://portal.mda.gov.br/portal/saf/programas/pronaf), criou o sistema nacional de merenda. A comunidade produz a merenda e a criança come. Essa despesa a mãe não tem.


É uma revolução.


Essa é uma mudança absolutamente incalculável, incalculável, não tem volta.”


Governo 'exporta' programas sociais

A estimativa é que 65 países já tenham se inspirado em ideias brasileiras, como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida

19 de dezembro de 2011 | 3h 04

LISANDRA PARAGUASSU / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, lançou na última semana seu mais novo programa social, o Misión Hijos de Venezuela, em que famílias pobres irão receber o equivalente a US$ 100 mensais para manter até três filhos na escola. A semelhança com o Bolsa Família brasileiro não é apenas coincidência.

Chávez, assim como outros presidentes dos dois lados do oceano Atlântico, tem contado com o apoio do governo brasileiro para criar suas próprias versões dos programas sociais criados no Brasil.

Estima-se dentro do governo que 65 países usem algum dos programas brasileiros. Prestes a enfrentar sua terceira tentativa de reeleição, possivelmente a mais dura delas, Chávez aposta justamente nesses programas com viés popular para atrair de volta parte da população pobre que se afastou de seu projeto bolivariano.

Além da Misión Hijos de Venezuela, Chávez implantou uma versão local do Minha Casa, Minha Vida, o Gran Misión Viviendas, sua tentativa de resolver o crônico problema de moradias no país, especialmente na capital, Caracas.
Essa cópia detalhada do projeto brasileiro vai da urbanização das favelas até a forma dos contratos de financiamento, e conta com uma ajuda de peso: a ex-presidente da Caixa Econômica Federal Maria Fernanda Coelho vai ao país uma vez por mês dar assessoria técnica aos venezuelanos. Ela atende a um pedido do próprio ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Apesar de recente, o Minha Casa, Minha Vida já entrou na pauta de cooperação externa do Brasil. Hoje há seis países africanos e latino-americanos que recebem ajuda brasileira para implantá-lo. Um deles é a Nicarágua, onde Daniel Ortega também enfrentou uma dura reeleição este ano. Seu chanceler, Samuel Santos, esteve no Brasil em julho tratando justamente dos projetos de cooperação.

"O Brasil é visto hoje como um laboratório de políticas sociais, tanto pelos países que vêm pedir cooperação como pelos desenvolvidos, que nos pedem para fazer mais projetos", justifica o presidente da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), embaixador Marcos Farani. "Temos hoje projetos de cooperação com 65 países. Eu diria que em todos existe algum programa social."

O próprio governo brasileiro oferece aos vizinhos e aos africanos suas experiências sociais. O Segundo Tempo, do Ministério dos Esportes, recentemente alvo de denúncias que mostraram o programa como um duto para desvio de dinheiro através de organizações não-governamentais de fachada, virou estrela das propostas de cooperação esportiva. O programa já foi iniciado em cinco países - entre eles Angola e Moçambique - e há outras propostas aguardando a resposta brasileira.

Transferência de renda. Um dos projetos mais pedidos é o fiador de boa parte da popularidade de Lula, o Bolsa Família. De acordo com Farani, os programas do Ministério do Desenvolvimento Social, com ênfase na transferência de renda para famílias pobres, só perdem para os da Agricultura, que vão desde o desenvolvimento de tecnologias pela Embrapa até os de compra local, passando por financiamento de agricultura familiar e alternativas para o produção de biocombustíveis.

Atualmente, pelo menos 14 países copiam ou planejam copiar o Bolsa Família. A procura pelo programa, no entanto, tem arrefecido. As dificuldades de implantação do projeto muitas vezes assustam os possíveis candidatos a "Lulas" locais. A promessa de popularidade nem sempre compensa os problemas que surgem.

"Não é fácil implantá-lo", explica Farani. "O Bolsa Família necessita não apenas de recursos financeiros, mas de uma estrutura. É um processo complexo, exige uma enorme capilaridade para atender os beneficiários, exige uma rede bancária eficiente. Eles querem entender, mas nem sempre vão adiante."

Investimento. Normalmente, o lado brasileiro da cooperação não custa muito. São apenas os recursos para enviar e manter técnicos no país que recebe o projeto. No caso do Gran Misión Vivienda, na Venezuela, a projeção é de pouco menos de US$ 270 mil.

Há casos, no entanto, em que o Brasil participa mais ativamente. Em Moçambique e Angola, a criação do Pintando a Liberdade - projeto do Ministério do Esporte em que presos fabricam material esportivo - contou com a doação de matéria-prima por empresas brasileiras.

Outro projeto ao qual o ex-presidente Lula dava muita atenção, o dos biocombustíveis, também teve mais investimentos brasileiros. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) foi a responsável por estudos de viabilidade em pelo menos 12 países latino-americanos e africanos.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

A Ópus Dei na América Latina

4.03.2006

Por Henrique Júdice Magalhães

geosapiens 



Analisando a estrutura de classes dos países latino-americanos, Darcy Ribeiro identificava como segmento hegemónico dentro das classes dominantes o corpo de gerência das transnacionais. Ponta de lança do imperialismo, é ele quem dita ordens e impõe ideologias às demais fracções e, em muitos casos, organiza-as politicamente. A desnacionalização das economias latino-americanas na década de 90 agravou este quadro. 
 
A alteração de mais relevo no perfil da classe dominante verificada no bojo deste processo é o crescimento da influência da Opus Dei. Sustentada pelo capital espanhol, a organização controla jornais, universidades, tribunais e entidades de classe, sendo hoje peça chave para se compreender o processo político no continente, inclusive no Brasil, onde quer eleger Geraldo Alckmin presidente da República.

 
Procissão Católica na Espanha, berço da Opus Dei.

Mas o que é afinal, a Opus Dei (em latim, Obra de Deus)?
Em seu campo original de actuação, é a vanguarda das tendências mais conservadoras da Igreja Católica. "Este concílio, minhas filhas, é o concílio do diabo" teria dito seu fundador, Josemaria Escrivá de Balaguer, sobre o Vaticano II, no relato do jornalista argentino Emilio J. Corbiere no seu livro "Opus Dei. El totalitarismo católico".
 
Fundada na Espanha em 1928, a organização foi reconhecida pelo Vaticano em 1947. Em 1982, foi declarada uma prelatura pessoal, o que, sob o Direito canónico, significa que só presta contas ao papa e que seus membros não se submetem à jurisdição dos bispos. "A relação entre Karol Wojtyla e a Opus Dei" conta o teólogo espanhol Juan José Tamayo Acosta "atinge seu êxito nos anos 80-90, com a irresistível ascensão da Obra à cúpula do Vaticano, a partir de onde interveio altivamente, primeiro no esboço e depois na colocação em prática do processo de restauração da Igreja católica sob o protagonismo do papa e a orientação teológica do cardeal alemão Ratzinger."
 
Fontes ligadas à Igreja Católica atribuem o poder da Obra à quitação da dívida do Banco Ambrosiano, fraudulentamente falido em 1982.
 
Obscurantismo e misoginia são traços que marcam a organização. Exemplos podem ser encontrados nas denúncias de ex-adeptos como Jean Lauand, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo – Universidade de São Paulo (USP), que recentemente escreveu junto com mais dois ex-membros, o juiz Márcio Fernandes e o médico Dário Fortes Ferreira, o livro "Opus Dei – os bastidores". Em entrevista ao programa Biblioteca Sonora, da Rádio USP, Jean Lauand conta que a Obra tem um "Index" de livros proibidos que abrange praticamente toda a filosofia ocidental desde Descartes. Noutra entrevista, à revista Época, Jean Lauand denuncia as estratégias de fanatização dos chamados numerários, leigos celibatários que vivem em casas da organização: "Os homens podem dormir em colchões normais, as mulheres têm de dormir em tábuas. São proibidas de segurar crianças no colo e de ir a casamentos". É obrigatório o uso de cinturões com pontas de ferro fortemente atados à coxa, como prática de mortificação que visa refrear o desejo. Mas os danos infligidos pelo fanatismo não se limitam ao corpo. 
 
No site que mantém com outros dissidentes (http://www.opuslivre.org/), Jean Lauand revela que a Obra conta com médicos especialmente encarregados de receitar psicotrópicos a numerários em crise nervosa.
 
A captação de numerários dá-se entre estudantes de universidades e escolas secundárias de elite. Centros de estudos e obras de caridade servem de fachada. A Opus Dei tem forte presença na USP, em especial na Faculdade de Direito, onde parte do corpo docente é composta por membros e simpatizantes, como o numerário Inácio Poveda e o director Eduardo Marchi. Outro expoente da organização na USP é Luiz Eugênio Garcez Leite, professor da Faculdade de Medicina e autor de panfletos contra a educação mista. A Obra actua também na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade de Campinas (Unicamp) e Universidade de Brasília (UnB).

 
Fazendo a América
Mas a Opus Dei é mais que um tema de saúde pública. Ela tem, desde a origem, uma clara dimensão política. Durante a ditadura de Franco, praticamente fundiu-se ao Estado espanhol, ao qual forneceu ministros e dirigentes de empresas e órgãos governamentais.No fim da década de 40, inicia sua expansão rumo à América Latina. Não foi difícil conquistar adeptos entre oligarquias como as da Cidade do México, Buenos Aires e Lima, que sempre buscaram diferenciar-se de seus povos apegando-se a um conceito conservador de pretensa hispanidade. Um dos elementos definidores desse conceito é exactamente o integralismo católico. 
 
Alberto Moncada, outro dissidente, conta em seu livro "La evolución del Opus Dei": "os jesuítas decidiram que seu papel na América Latina não deveria continuar sendo a educação dos filhos da burguesia, e então apareceu para a Opus Dei a ocasião de substituí-los – ocasião que não hesitou em aproveitar".
 
No Brasil, a organização deitou raízes em São Paulo no começo da década de 50, concentrando sua actuação no meio jurídico. O promotor aposentado e ex-deputado federal Hélio Bicudo conta que por duas vezes juízes tentaram cooptá-lo. Seu expoente de maior destaque foi José Geraldo Rodrigues Alckmin, nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) por Médici em 1972 e tio do actual governador de São Paulo. Acontece que nos anos 70, o poder da Opus Dei era embrionário. Tinha quadros em posições importantes, mas sem actuação coordenada. Além disso, dividia com a Tradição, Família e Propriedade (T.F.P.) as simpatias dos católicos de extrema-direita. 
 
Era natural, da mesma forma, que, alguns quadros dos regimes nascidos dos golpes de Estado de 1966 e 1976, na Argentina, e 1973, no Uruguai, fossem também quadros da Opus Dei. Mas segundo se lê no livro de Emilio J. Corbiere , sua actuação era ainda dispersa, o que não os impediu de controlar a Educação na Argentina durante o período Onganí (1966-70). 
 
Já no Chile, a Opus Dei foi para o pinochetismo o que havia sido para o franquismo na Espanha. O principal ideólogo do regime, Jaime Guzmá, era membro activo da organização, assim como centenas de quadros civis e militares. 
 
No México, a Obra conseguiu fazer Miguel de la Madrid presidente da República em 1982, iniciando a reversão da rígida separação entre Estado e Igreja imposta por Benito Juárez entre 1857 e 1861.
 

Internacional reaccionária
A Opus Dei não criou o reacionarismo católico, antes, teve nele sua base de cultura. Mas sistematizou-o doutrinariamente e organizou politicamente seus adeptos de uma forma quase militar. Hoje, funciona como uma espécie de Internacional reaccionária, congregando, coordenadamente, adeptos em todo o mundo. 
 
Concorrem para isto, nos anos 90, o ápice do poder da Obra no Vaticano e a invasão da América Latina por transnacionais espanholas. 
 
A Argentina entregou suas estatais de telefonia, petróleo, aviação e energia á Telefónica, Repsol, Iberia e Endesa, respectivamente. A Telefónica controla o sector também no Peru e em São Paulo. A Iberia já havia engolido a LAN, do Chile, onde a geração de energia também é controlada pela Endesa. Bancos espanhóis também chegaram ao continente neste processo. 
 
No Brasil, o Santander comprou o Banespa e o Meridional, enquanto que o BBVA recebeu os activos do Excel através do Proer, no governo de Fernando Henrique Cardoso. 
 
"A Opus Dei tem sido para o modelo neoliberal o que foram os dominicanos e franciscanos para as cruzadas e os jesuítas frente à Reforma de Lutero" compara José Steinsleger, colunista do diário mexicano "La Jornada".

A organização actua também no monopólio da imprensa. Controla o jornal "El Observador", de Montevidéu, e exerce influência sobre órgãos tradicionais da oligarquia como "El Mercurio", no Chile, "La Nación", na Argentina e "O Estado de São Paulo", no Brasil. O elo com a imprensa é o curso de pós-graduação em jornalismo da Universidade de Navarra em São Paulo, coordenado por Carlos Alberto di Franco, numerário e comentarista do "Estadão" e da Rádio Eldorado. O segundo homem da Opus Dei na imprensa brasileira é o também numerário Guilherme Doring Cunha Pereira, herdeiro do principal grupo de comunicação do Paraná ("Gazeta do Povo"). 
 
Os jornalistas Alberto Dines e Mário Augusto Jakobskind denunciam que a organização controla também a Sociedade Interamericana de Imprensa – SIP (na sigla em espanhol). 
 
Sedeada na Espanha, a Universidade de Navarra é a jóia da coroa da Opus Dei no negócio do ensino. Sua receita anual é de 240 milhões de euros. Além disso, a Obra controla as universidades Austral (Argentina), Montevideo (Uruguai), de Piura (Peru), de Los Andes (Chile), Pan Americana (México) e Católica André Bello (Venezuela)
 
Dentro da igreja católica, a Opus Dei emplacou, na última década, vários bispos e Cardeais na América Latina. O mais notável é Juan Luís Cipriani, de Lima, no Peru, amigo íntimo da ditadura de Alberto Fujimori. Em seu estudo "El totalitarismo católico em el Peru", o jornalista Herbert Mujica denuncia que quando o Movimento Revolucionário Tupac Amaru tomou a embaixada do Japão, em 1997, Juan Luís Cipriani, valendo-se da condição de mediador do conflito, instalou equipamentos de escuta que possibilitaram à polícia invadir a casa e matar os ocupantes. 
 
Na Venezuela, a Obra teve papel essencial no fracassado golpe de 2002 contra Hugo Chávez. Um dos articuladores da tentativa foi José Rodríguez Iturbe, nomeado ministro das Relações Exteriores. Também participou da articulação à embaixada da Espanha, governada na época pelo neo-franquista Partido Popular (PP)
 
Após os reveses na Venezuela, as esperanças da Opus Dei voltaram-se para Joaquím Laví, no Chile, e Geraldo Alckmin, no Brasil, hoje seus quadros políticos de maior destaque.  
 
Joaquím Laví foi derrotado nas últimas eleições presidenciais chilenas em Dezembro. Resta o Brasil, onde a Obra tenta fazer de Geraldo Alckmin presidente e formar um eixo geopolítico com os governos Álvaro Uribe (Colombia) e Vicente Fox (México), aos quais está intimamente associada.

 
Entranhas mafiosas

Além das dimensões religiosa e política, a Opus Dei tem uma terceira face: a de sociedade secreta de cunho mafioso. Em seus estatutos secretos, redigidos em 1950 e publicados em 1986 pelo jornal italiano "L´Expresso", a Obra determina que "os membros numerários e supernumerários saibam que devem observar sempre um prudente silêncio sobre os nomes dos outros associados e que não deverão revelar nunca a ninguém que eles próprios pertencem à Opus Dei.
 
Inimiga jurada da Maçonaria, ela copia sua estrutura fechada o que frequentemente serve para encobrir actos criminosos. 
 
Entre os católicos, a Opus Dei é conhecida como "Santa Máfia", Emilio J. Corbiere lembra os casos de fraude e remessa ilegal de divisas nas empresas espanholas Matesa e Rumasa, em 1969, onde parte dos activos desviados financiaram a Universidade de Navarra. Bancos espanhóis são suspeitos de lavagem de dinheiro do narcotráfico e da máfia russa. A Opus Dei também esteve envolvida nos episódios de falência fraudulenta dos bancos Comercial (Uruguai, pertencente à família Peirano, dona de "El Observador") e de Crédito Provincial (Argentina)
 
Na Argentina os responsáveis pelas desnacionalizações da petrolífera YPF e das Aerolineas Argentinas, compradas por empresas espanholas, em dois dos maiores escândalos de corrupção da história do país, tiveram sua impunidade assegurada pela Suprema Corte, onde pontificava António Boggiano, membro da Opus Dei. 
 
 
No Brasil, as pretensões de controlo sobre o Judiciário 
esbarram no poder dos Maçons. 
 
A Opus Dei controla, porém, o Tribunal de Justiça de São Paulo através da manipulação de promoções. Segundo fontes do meio jurídico paulista, de 25 a 40% dos juízes de primeira instância no estado pertencem à organização – proporção que se repete entre os promotores, no tribunal, a proporção sobe para 50 a 75%. 
 
Recentemente, o tribunal, em julgamento secreto, decidiu pelo arquivamento de denúncia contra Saulo Castro Abreu Filho, braço direito de Geraldo Alckmin, acusado de organizar grupos de extermínio desde a secretaria de Segurança, e contra dois juízes acusados de participação na montagem desses grupos. 
 
A fusão dos tribunais de Justiça e de Alçada, determinada pela Emenda Constitucional n.º 45, foi uma medida da equipe do ministro da Justiça, Mácio Thomaz Bastos, para reduzir o poder da Obra no judiciário paulista, cuja orientação excessivamente conservadora, principalmente em questões criminais e de família, é motivo de alarme entre profissionais da área jurídica.

Ligações poderosas - Opus Dei e Geraldo Alkimin




Revista Época - 12/01/2006

Carlos Alberto Di Franco dá formação cristã ao governador Geraldo Alckmin e treinou mais de 200 editores da imprensa

Carlos Alberto Di Franco, 60 anos, é um dos numerários mais influentes e bem relacionados do Opus Dei. Representante no Brasil da Escola de Comunicação da Universidade de Navarra e diretor do Master em Jornalismo, um programa de capacitação de editores que já formou mais de 200 cargos de chefias dos principais jornais do País, é citado no livro Opus Dei - Os Bastidores como o executor da política da Obra para a mídia do Brasil e na América Latina.

Nos últimos anos, tem feito periodicamente uma preleção sobre valores cristãos na ala residencial do Palácio dos Bandeirantes a convite do governador Geraldo Alckmin (confira matéria na página xx). O encontro, apelidado de 'Palestra do Morumbi', reúne um seleto grupo de empresários e profissionais do Direito, entre eles o vice-presidente da Fiesp, João Guilherme Ometo. Na sede do Master, em São Paulo, em cujos andares superiores funciona o centro da Obra onde vive, Di Franco deu a seguinte entrevista a Época.

ÉPOCA - A partir do final dos anos 80 a Universidade de Navarra, que é do Opus Dei, passou a dar cursos nas redações brasileiras. Como surgiu essa estratégia?
Carlos Alberto Di Franco
- Vários professores de lá participaram de um seminário no Rio e chamaram atenção pela sua visão de Jornalismo. Esse foi o início de um trabalho não de universidade, mas de consultoria de alguns profissionais que também são professores em Navarra. Mais recentemente Navarra montou uma empresa de consultoria que atualmente está sendo reestruturada, e eu tenho uma empresa e contrato consultores de Navarra e também daqui.

ÉPOCA - O Master em Jornalismo é uma estratégia do Opus Dei para influenciar a imprensa brasileira e da América latina?
Di Franco -
Absolutamente nada a ver. É um trabalho profissional meu. A única coincidência é que Carlos Alberto Di Franco é do Opus Dei. A imprensa tem suficiente discernimento e filtros próprios para se deixar submeter a qualquer coisa deste tipo.

ÉPOCA - O senhor é numerário do Opus Dei, é representante da Escola de Comunicação da Universidade de Navarra, que é do Opus Dei, o Master traz professores de Navarra que também são numerários, mas o senhor afirma que não há nenhuma estratégia do Opus Dei em influenciar a imprensa através de um curso de formação de editores?
Di Franco -
Muitos professores de Navarra que vêm não são do Opus Dei. O Master é um programa técnico de capacitação de editores e não de Religião. O Master tem uma identidade cristã? Claro. Quando eu abro o Master, a primeira coisa que eu faço é dizer que o centro conta com serviço de capelania entregue à prelazia do Opus Dei. Isso implica numa série de serviços de atendimento espiritual para quem queira recebê-los. Deixo absolutamente claro o que acontece aqui. O prestígio do Master não depende do número de gotas de água benta, mas de sua qualificação profissional.

ÉPOCA - Quantos professores tem o Master e, destes, quantos são do Opus Dei?
Di Franco -
Onze fixos, seis são da Obra.

ÉPOCA - São Escrivá disse que era preciso embrulhar o mundo em papel-jornal...
Di Franco -
Qualquer pessoa que pense dois minutos percebe que os meios de comunicação são um poderoso facho para o bem e para o mal. Essa preocupação de evangelização tendo em conta os meios de comunicação social é legítima. Mas você poderá difundir a mensagem cristã não com água benta e nem metendo-se a montar estruturas piegas, mas atuando na sua atividade profissional. Estou convicto de que se o mundo tiver mais cristãos ou gente comprometida com sua fé será um lugar melhor.

ÉPOCA - O senhor publicou um artigo no jornal O Estado de S.Paulo criticando o Código da Vinci, um livro de ficção que mostra o Opus Dei como uma seita capaz de assassinar para alcançar seus objetivos. O senhor assina como jornalista e professor de ética. O senhor não acha que deveria ter informado ao leitor que é um numerário?
Di Franco -
Não, porque não acrescenta nada. Na mídia todo mundo sabe.

ÉPOCA - O senhor acredita que todos os leitores do jornal sabem?
Di Franco -
Todos os leitores não, mas eu não sei o que ser membro do Opus Dei acrescenta ao meu currículo. O que eu fiz foi uma análise do Dan Brown mostrando a sua desonestidade intelectual que qualquer jornalista poderia fazer, budista ou ateu.

ÉPOCA - Poderia. Mas o senhor não acha que a informação de que quem criticava um livro contra o Opus Dei era alguém do Opus Dei teria sido relevante para o leitor?
Di Franco -
Eu fiz uma crítica técnica e não movida por razões religiosas.

ÉPOCA - Como começaram as 'palestras do Morumbi', que acontecem na última quarta-feira do mês, no Palácio, com o governador Geraldo Alckmin e um grupo de empresários e profissionais do Direito?
Di Franco -
Não é uma reunião regular, depende das agendas. O governador é cristão, muito católico. Nesta reunião tratamos temas relacionados a práticas ou virtudes cristãs.

ÉPOCA - De quem partiu essa idéia?
Di Franco -
Nasceu de uma conversa do governador com um sacerdote da Obra com quem ele tem direção espiritual periódica.

ÉPOCA - O Padre (José) Teixeira, confessor do governador?
Di Franco -
Isso, o Padre Teixeira. Aí eu e o governador conversamos sobre a melhor maneira de fazer e sobre quem participaria. O grupo é formado por amigos comuns, todos católicos. Eu sou o palestrante. Uma coisa rápida, meia-hora, um cafezinho. A última foi em agosto ou setembro. Depois teríamos outra, mas eu não pude. Agora ele entrou em campanha. Acredito que no final de janeiro combinaremos a próxima.

ÉPOCA - Essas palestras são pagas?
Di Franco -
Não é um trabalho profissional, é uma atividade de formação cristã.


ÉPOCA - O senhor não acha que a proibição de ir ao cinema, teatro ou estádio de futebol conflitua com seu trabalho de jornalista?
Di Franco -
Para mim nunca foi problema. Não é que não pode, a expressão está mal colocada. Não vai ao cinema porque não quer ir ao cinema. Os numerários vivem, voluntariamente, uma série de abstenções em função de sua entrega como numerários.

ÉPOCA - Como o senhor faz com o cilício?
Di Franco -
O cilício é uma mortificação corporal ultratradicional na Igreja. Se você falar com qualquer pessoa que viva o cristianismo é a coisa mais corriqueira e comum.

ÉPOCA - O senhor usa, duas horas por dia?
Di Franco -
Sim, como qualquer numerário.

ÉPOCA - Quando o senhor está com o cilício se concentra no sofrimento de Cristo?
Di Franco -
Essa pequena mortificação você oferece por várias intenções. A partir de hoje vou oferecer para você.

ÉPOCA - Não é necessário.
Di Franco -
Como colega. O incômodo se oferece.

ÉPOCA - É muito difícil o celibato?
 Di Franco - Qualquer pessoa tem desejo, é normal. Eu sinto atração pelas mulheres, claro que sinto, sobretudo pelas bonitas.

ÉPOCA - O senhor é virgem?
Di Franco -
Você está entrando em território perigoso. Mas sou, se quer saber sou.



A ESTRUTURA DA OBRA
A maioria dos membros são leigos. Eles se dividem nas seguintes categorias
Numerários: Membros celibatários que vivem em centros da Obra e cumprem um rígido programa diário de rezas e rituais. Comprometem-se com a probreza pessoal e a obediência irrestrita aos superiores. Os ganhos auferidos na atuação profissional são administrados pela instituição, assim como o patrimônio. Mulheres e homens vivem separados
Supernumerários: Podem casar e constituir família. Espera-se que tenham muitos filhos e os orientem para servir à Obra. Sua contribuição financeira deve ser equivalente aos gastos com mais um filho
Adscritos: Assumem as mesmas obrigações que um numerário, mas não vivem nos centros
Adjuntos: Numerários que ainda não vivem em casas da Obra, em geral com menos de 18 anos
Auxiliares: Numerárias que realizam as tarefas domésticas do centro. A maioria é recrutada na zona rural
Sacerdotes numerários: Aqueles que são ordenados padres
Cooperadores: Não são membros da Obra, mas colaboram financeiramente com ela. Podem ser não-cristãos e inclusive ateus

A vida íntima do Opus Dei

Revista Época

12/01/2006

Dissidentes brasileiros travam uma guerra contra a poderosa prelazia do papa e revelam segredos até então bem guardados 

Eliane Brum e Débora Rubin

Quando era do Opus Dei, Antonio Carlos Brolezzi foi obrigado a usar um macacão antimasturbação. O equipamento se destinava a combater a 'doença' que seu confessor diagnosticou como 'erotismo mental'. Tratava-se de uma calça jeans e uma camisa de flanela costuradas uma na outra e vestidas de trás para a frente com o objetivo de impedir o jovem de 20 anos de alcançar a parte mais íntima de sua anatomia. Brolezzi, hoje um bem casado professor do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo, tem se dedicado a narrar em tom confessional as lembranças sexuais de uma década dentro da poderosa prelazia do papa.

O CORPO É O INIMIGO
Os numerários têm de usar o cilício duas horas por dia, no alto da coxa (como mostra a imagem acima). A mortificação evoca o sofrimento de Cristo na cruz. Disse o fundador da Obra: 'Trata o teu corpo com caridade, mas não com mais caridade que a que se tem com um inimigo traidor'


Pela primeira vez no Brasil, dissidentes retiram o manto de silêncio que envolve a 'Obra de Deus' (em latim, Opus Dei)e dedicam-se hoje a exibi-la em praça pública - alguns deles com uma sanha digna daquelas ex-mulheres que, na recente crônica política do país, enlamearam a imagem de figurões da República. Nada podia ser pior para uma instituição que usa a discrição como estratégia. A vida íntima do Opus Dei está sendo devassada. Dividido em duas partes - 'Memórias sexuais de um Numerário' e 'Manual do Ex-Numerário Virgem' -, o livro de Brolezzi deverá ser o próximo míssil editorial lançado contra a ultraconservadora organização católica.

Os 'numerários' a que se refere o livro são a espinha dorsal da Obra: os leigos celibatários que vivem nos centros da instituição e cumprem um ritual diário de rezas e mortificações. Já os supernumerários podem casar, ter filhos e patrimônio próprio. Na Espanha, onde o movimento foi fundado em 1928, já existe uma espinhosa bibliografia com relatos de ex-membros. No Brasil, porém, onde o Opus Dei só aportou no fim dos anos 50, a organização havia conseguido manter seus adeptos e suas práticas em segredo, obediente ao figurino pregado pelo fundador, Josemaría Escrivá de Balaguer (1902-1975). Em Caminho, o guia do Opus Dei, Escrivá enfatiza: 'O desprezo e a perseguição são benditas provas de predileção divina, mas não há prova e sinal de predileção mais belo do que este: passar oculto'. Agora esse ideal tornou-se inalcançável também no maior país católico do mundo.


A declaração de guerra, no fim de outubro, foi o lançamento do livro Opus Dei - Os Bastidores (Verus Editora), escrito por três dissidentes da Obra. Um deles, Jean Lauand, professor da Faculdade de Educação da USP, havia vivido 35 anos como numerário. Lauand era uma das figuras mais populares da ordem até abandoná-la, há dois anos. Conhece como poucos sua atuação no Brasil. Ao deixá-la, tornou-se uma pedra no meio do caminho da obra de Escrivá.

O segundo ataque foi lançado pela mãe de um numerário, Elizabeth Silberstein. Usando o apelo de uma mãe em luta para resgatar o filho das 'garras da seita', ela escreveu e lançou em dezembro o livro Opus Dei - A Falsa Obra de Deus - Alerta às Famílias Católicas. A publicação, bancada por ela, copia a estrutura de um manual para pais que tiveram seus filhos seqüestrados pelas drogas. Ao Opus Dei é reservado o papel de traficante. O quinto capítulo, por exemplo, é intitulado 'Alerta: meu filho foi captado por eles! O que posso fazer?'.

As denúncias poderiam ser apenas uma daquelas constrangedoras brigas de família se o Opus Dei não fosse a única prelazia pessoal do papa - e a Igreja Católica a mais poderosa instituição religiosa do Ocidente. Desde o lançamento em 2003 do best-seller de Dan Brown O Código Da Vinci (mais de 40 milhões de exemplares vendidos), a Obra vive sob incômodos holofotes. No enredo, a organização é capaz de cometer assassinatos para impedir a revelação de verdades indesejáveis sobre Jesus. O fato de ser uma história de ficção não impediu arranhões profundos na imagem do Opus Dei. Para piorar, o filme baseado no livro estreará em maio, com Tom Hanks no papel principal e vocação de blockbuster. O momento, portanto, é propício para os membros da prelazia evocarem o ensinamento do fundador: 'Não pretendas que te compreendam. Essa incompreensão é providencial: para que o teu sacrifício passe despercebido'.


No Brasil, a reação dos dissidentes organizou-se a partir da criação de um site na internet, o www.opuslivre.org - quartel-general virtual em que ex-adeptos trocam confidências e dicas de 'sobrevivência'. Antonio Carlos Brolezzi conta que quando recebeu o primeiro e-mail do site teve uma tremedeira. 'Tive pesadelos e disse que não queria mais receber aquele tipo de correspondência', conta. 'Responderam-me que tudo bem, mas que havia chegado a hora de botar a boca no trombone e exorcizar os fantasmas. Antes, quem saía da Obra ficava isolado. Com a internet as pessoas passaram a conversar. Parei de tremer e decidi escrever o livro.'

Numerários influentes, como o jornalista Carlos Alberto Di Franco, enfrentam o fenômeno com o estoicismo pregado por Escrivá. 'A campanha difamatória é dolorosa, mas ao mesmo tempo será boa para a Obra no Brasil porque é o sinal da cruz de Cristo', afirma Di Franco. 'A contradição, a calúnia e a difamação sempre tiveram um papel na história da Igreja. Não há cristianismo sem cruz.'
Dom Geraldo Majella Agnelo, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, disse a ÉPOCA que, se algum membro da prelazia procurar a CNBB com denúncias de violação de direitos humanos, ele encaminhará o assunto à Santa Sé. 'Como instituição, o Opus Dei foi aprovado. Mas, se há erros, aí é diferente.

Eles devem ser apontados e comprovados para ser julgados por autoridades competentes.' O escritório de informação do Opus Dei no Brasil, em resposta por escrito, afirma que a Obra já havia passado pela experiência de ser criticada por ex-membros em outros países. 'Ainda que a imensa maioria dos que se aproximam das atividades apostólicas e formativas do Opus Dei conserve sempre um enorme carinho e agradecimento, não é de estranhar que ocorram algumas exceções', diz João Gustavo Racca, do escritório brasileiro.


Erra quem vê o Opus Dei como um entre tantos movimentos católicos conservadores, como Arautos do Evangelho, TFP e Focolare. Desde que João Paulo II a ungiu com o status de prelazia pessoal, em 1982, a Obra tornou-se oficialmente corpo e sangue da Igreja. Prevista pelo Concílio Vaticano II (1962-1965) e incorporada pelo Código de Direito Canônico, essa nova figura jurídica garantiu ao Opus Dei um duplo privilégio. Por um lado, espalha-se pelo mundo sob o escudo da tradição milenar da Igreja de Roma. Por outro, é independente dos bispos e dioceses. A Obra só obedece ao prelado, cargo vitalício hoje ocupado por dom Javier Echevarría. E ele só presta contas ao papa.

Dentro do Vaticano, o Opus Dei incomoda os cardeais mais progressistas, que assistiram alarmados às demonstrações de entusiasmo de João Paulo II. A canonização do fundador da Obra aconteceu em tempo recorde para os padrões da Igreja, apenas 27 anos após sua morte. Bem diferente, por exemplo, do caso de José de Anchieta, cuja patente de santo é uma causa antiga dos brasileiros: o jesuíta morreu em 1597, mas só se tornou beato em 1980 e não há estimativa de quando possa virar santo. Antes da canonização, Escrivá era uma figura controversa. Jesuítas espanhóis o acusavam de criar uma 'maçonaria dentro da igreja' e até de promover 'uma nova heresia'.

Bento XVI é mais sóbrio na exposição de seus afetos que seu antecessor, mas a obediência dos membros do Opus faz da instituição um aliado valioso em um mundo onde a maioria dos fiéis prefere escolher as próprias opiniões.

'Obedecei, como nas mãos do artista obedece um instrumento 
- que não se detém a considerar por que faz isto ou aquilo - 
certo de que nunca vos mandarão coisa que não seja boa 
e para toda a Glória de Deus', 
aconselha Escrivá.


Em Opus Dei - Um Olhar Objetivo para Além dos Mitos e da Realidade da Mais Controversa Força da Igreja Católica, o jornalista especializado em Vaticano John Allen Jr. compara a Obra a uma Guiness Extra Stout. Como a tradicional cerveja irlandesa, em um mercado repleto de produtos diet, light e até sem álcool, o Opus Dei é um reduto de tradição em meio a um catolicismo que, desde o Concílio Vaticano II, tomou vários atalhos em sua vivência cotidiana.

Seu livro, lançado no fim de 2005, ainda sem tradução no Brasil, é o representante mais recente de uma ampla bibliografia destinada a produzir um retrato do Opus Dei isento de paixões. Como a cerveja preta e extra-forte, a organização sempre terá, segundo o autor, um número fiel de seguidores para os quais representa uma âncora irremovível num mundo movediço.

Quem pertence ao Opus Dei não tem dúvidas nem relativismos numa sociedade povoada por ambos: pensa com a Igreja e vive como o papa manda.

'A Igreja Católica não é uma democracia'
diz a numerária Maria Lúcia Alckmin.

 Para membros da Obra, parte significativa dos católicos não passa de 'católicos de censo' - que servem para expandir as estatísticas, mas seguem apenas as crenças pessoais. Em Caminho, Escrivá demonstra desprezo com relação a essa humanidade supostamente sem ideal: 'Que conversas! Que baixeza e que... nojo! - e tens de conviver com eles, no escritório, na universidade, no consultório... no mundo'.

Com apenas 85 mil seguidores - 1.700 no Brasil -, o Opus Dei é irrelevante do ponto de vista quantitativo. Mas seus admiradores são estimados na casa dos milhões. Em 1950, num lance ousado, Escrivá conseguiu inédita autorização do Vaticano para aceitar cooperadores (leia-se financiadores) não-católicos e não-cristãos. Assim, a Obra tem apoiadores espalhados pelo mundo das mais variadas doutrinas - inclusive aqueles que nem sequer acreditam na existência de Deus. Além de aumentar o poder de penetração do movimento nas diversas instâncias da sociedade, os cooperadores representam uma boa fonte de recursos. O vaticanista Allen estima o patrimônio da organização em US$ 2,8 bilhões - pouco se comparado ao da Igreja nos Estados Unidos (US$ 102 bilhões), muito se o parâmetro for a quantidade de membros.

Cada numerário é obrigado a deixar salário e patrimônio para o Opus Dei.

 'Quando completei cinco anos na Obra, tive de lavrar um testamento deixando minha herança para a instituição', conta o ex-numerário David Fernandes, engenheiro do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). 'Quando saí, não me devolveram nada, mas acredito que não tentem me tomar as coisas. Se a Obra é tão boa, por que não há uma plaquinha na frente de cada centro dizendo o que são?'

A grande força do Opus Dei é sua proposta de 'santificação no meio do mundo'. Escrivá construiu a biografia para tornar-se 'o santo do cotidiano': 'elevar o mundo a Deus e transformá-lo a partir de dentro'. Em lugar de padres e freiras confinados em conventos ou dioceses, o exército de leigos da Obra vive em centros e cumpre o celibato, mas atua em postos estratégicos na sociedade como peças de uma engrenagem. Como diz Escrivá: 'Que preocupação há no mundo por mudar de lugar! Que aconteceria se cada osso, se cada músculo do corpo humano quisesse ocupar um posto diferente do que lhe compete? Não é outra a razão do mal-estar no mundo. Persevera no teu lugar, meu filho; daí, quanto poderás trabalhar pelo reinado efetivo do Senhor'.

 O numerário começa por obedecer ao 'plano de vida espiritual' com uma lista de obrigações diárias: duas orações mentais de meia hora, cinco minutos de leitura do Evangelho e dez de leitura espiritual, reza do terço, missa, comunhão seguida por dez minutos de ação de graças, meditação dos mistérios do rosário, reza das preces da Obra, exames de consciência particular e geral, reza de três ave-marias com os braços em cruz pedindo a castidade antes de dormir, aspersão de água-benta na cama para afastar as tentações do demônio. Uma vez por semana encontra-se com o diretor espiritual para uma 'conversa fraterna'. Nela, nada pode ser escondido. A etiqueta manda iniciar pelas revelações mais vergonhosas, obedecendo ao princípio da 'sinceridade selvagem'. 'Além de tudo isso, eu ainda ensinava na universidade. Voltava tarde e tinha de preparar aulas. Comecei a apresentar sintomas psicológicos estranhos, entrava em pânico', conta um engenheiro que deixou a Obra em novembro, depois de 24 anos. 'Pensei que acabaria morrendo se continuasse ali. Apavorado, fiz minhas malas e fui para um hotel.'

A liberdade religiosa, o direito de fazer o que bem entende com seu corpo e a livre manifestação são valores indiscutíveis. Quem pertence ao Opus Dei acredita que beijar o chão ao acordar e bradar 'Serviam' ('Eu servirei', em latim), cumprir rotina rígida e obedecer sem duvidar são um conforto e uma fonte de felicidade. Para os dissidentes, é lavagem cerebral - uma estratégia que usa a fé e a Igreja Católica para controlar e influenciar o mundo. São Escrivá teve o cuidado de reservar um ensinamento para esse impasse: 'Isso - o teu ideal, a tua vocação - é... uma loucura. E os outros - os teus amigos, os teus irmãos - uns loucos... Não tens ouvido, por vezes, esse grito bem dentro de ti? Responde, com decisão, que agradeces a Deus a honra de pertencer ao 'manicômio''.
 #Q:Entrevista com Antonio Carlos Brolezzi, ex-numerário e autor de um livro com dicas para quem abandona a obra:#





Memórias sexuais
Ex-numerário escreve um livro com dicas para quem abandona a Obra e quer reabilitar o desejo

Dez anos depois de abandonar o Opus Dei, Antonio Carlos Brolezzi escreve um livro em tom confessional sobre a Obra e o sexo. Dividido em duas partes, a primeira vai se chamar 'Memórias Sexuais de um Numerário' e a segunda 'Manual do Ex-Numerário Virgem'. Com 40 anos hoje, Brolezzi só perdeu a virgindade aos 30. Professor do Instituto de Matemática e Estatística da USP, casado pela segunda vez e pai de uma filha, ele conta algumas de suas lembranças na seguinte entrevista.

ÉPOCA - Como entrou para o Opus Dei?
Antonio Carlos Brolezzi -
Ninguém vai para o Opus conhecendo a proposta, eles disfarçam. Me convidaram para um curso de Astronomia com professores da USP. Achei estranho que não havia meninas, mas pensei que elas não se interessavam pelo tema. Eu era office-boy, não me vestia bem. Lá o pessoal se vestia bem, eu achava superchique. A gente tem vontade de se aproximar porque são pessoas que parecem os elfos do Senhor dos Anéis, seres meio distantes mas ao mesmo tempo admiráveis. Imagine que eu pensava que aqueles caras tinham namoradas sensacionais, superintelectuais também. Só depois, quando entramos, é que descobrimos que é tudo montado. Quando eu entrei na USP para cursar Matemática começaram a me ligar, não me deixavam em paz um segundo. Criaram uma crise artificial de vocação. Vendem que somos especiais, que temos uma luz na testa, e ficamos seduzidos. Passamos a ter acesso a uma porta secreta, mostram uma sala onde só eles se reúnem.

Você passa a ter uma vida secreta, não pode contar a sua família. Dá um passo aos 20 anos que só você sabe. Fazendo uma analogia com Harry Potter, é como se o Opus fosse o mundo dos magos e fora de lá o dos trouxas, que desconhecem a magia.

ÉPOCA - Que memórias sexuais tem alguém que não podia nem sequer pensar em sexo?
Brolezzi -
Eu acho muito interessante olhar para o Opus Dei sob o ponto de vista da sexualidade. Quando eu fui para o centro tinha 19 anos e nunca havia tido uma relação sexual. Foi chocante para mim quando decidiram que eu não podia mais dar beijo no rosto de colega na faculdade. Um dia uma colega veio me dar um beijo e eu virei a cara. Foi o que o Opus chama de 'ato heróico', mas eu passei a noite chorando. A idéia deles é que você ganha as batalhas fazendo pequenas coisas. Não é 'eu não vou transar', é 'eu não vou olhar'. Se tem uma revista de mulher pelada numa banca, você precisa atravessar a rua. Uma vez eu vi uma bunda numa revista e contei para o diretor. Ele falou: 'Essas revistas pintam as fotos. Porque não é rosa, é marrom, marrom!'. Ele gritava, acho que se referia ao ânus. Queria que eu visse sujeira nessas coisas. Em 1991, vi uma folha rasgada na rua, com uma loira, de quatro, que dava para ver a vagina por trás. Fiquei espantado. Esse negócio de não poder olhar tem efeito contrário, isso aconteceu em 1991 e eu nunca esqueci. No meu livro terá um capítulo chamado 'Como é a vagina'.

ÉPOCA - Como assim?
Brolezzi -
Uma vez eu fiz um desenho de uma mulher nua num caderno e fui me confessar. O confessor queria saber como eu desenhei se nunca tinha visto. Eu disse que imaginei como se fosse uma boca, só que na vertical. Ele riu, deu a entender que eu era um ignorante.

ÉPOCA - E como foi ver uma de verdade?
Brolezzi -
Foi a primeira broxada. Tinha 30 anos, era virgem, tinha acabado de sair da Obra e arrumado uma namorada. Fomos a um motel e ela perguntou: 'Você tem camisinha?'. Eu disse que não, e ela falou para eu pedir pelo telefone. Eu nem sabia o que era camisinha, imaginava que se comprava numa casa escura, que precisava de uma senha. No centro, quando falavam de sexo, falavam contra a camisinha. Pedi cinco, todo constrangido. Ela ficou toda feliz, mas eu não usei nenhuma. O motel tinha uma luz meio apagada, meio vermelha, aquilo soava como o antro do demônio. Ela tirou a roupa, se deitou e eu imaginei que tinha de deitar em cima dela, só que meu pênis estava murcho. Me veio na mente a maldição que eles me lançaram quando eu saí. Disseram que Deus tinha me feito para ser solteiro, então eu podia não funcionar. Falaram que se eu tivesse um filho ele poderia nascer deformado. Quando broxei, pensei que eu era um cara estragado. Fiquei dez anos na Obra e passei dez anos fora dela tendo tremedeira e uma sensação de terror cada vez que ouvia ou lia o nome Opus Dei. Só quando conheci Viviane e nasceu minha filha, Alice, é que consegui superar.

ÉPOCA - Como conseguiu transar, afinal?
Brolezzi -
Vou até dar umas dicas no livro para quem sai da Obra. Você precisa ter amizade com o sexo feminino, primeiro. Conversar, dançar, para quebrar o esquemão de numerário, de não poder olhar para mulher. Ir sentindo que a mulher não é um dragão.

ÉPOCA - Você chegou a vestir um macacão antimasturbação para que não se tocasse. Tinha muita culpa de se masturbar?
Brolezzi -
Quem se masturba não pode nem comungar. Por isso, nos últimos minutos de oração, o padre se recolhe na sacristia. Se você se masturbou à noite, vai lá e se confessa. Nos centros grandes a fila era enorme nessa hora, afinal, um monte de moleques de 20 anos. Eu dormia rezando o terço para não ter tentação. Os devotos que me desculpem, mas muitas vezes acordava com ele enrolado no pênis.

ÉPOCA - Por que chegou a hora de exorcizar os fantasmas escrevendo um livro?
Brolezzi -
Quero falar com naturalidade sobre tudo isso. Você mortifica os cinco sentidos, precisa combater cada um deles. Se você gosta de olhar para uma janela, decide que não vai olhar. Se gosta de sal, passa a comer sem sal. Faz coisas como não encostar na cadeira, não ouvir mais música. Somos treinados a imaginar que o cheiro do sexo é ruim. Por isso quero escrever, porque para mim foi problemático fazer essa desprogramação. Quero falar no livro sobre casamento, porque nós tínhamos palestras em que o padre nos falava que os supernumerários (membros casados do Opus Dei) reclamavam que a mulher cheirava a alho e a fritura, que tinham de tomar banho de novo, que era chato e desgastante. É como explicar a normalidade para uma pessoa que achou que a normalidade era anormal. Quem sai tem de entender que quando você casa às vezes você briga e sua mulher não precisa ser santa, que não dá para fazer a 'correção fraterna' (quando um numerário chama a atenção do outro por pequenos erros cometidos) na sua mulher. No começo do meu casamento eu fiquei superneurótico com esse negócio das toalhas, por exemplo. Achava que tinha de ter lugar certo, corrigia minha mulher. Eles também sempre ridicularizavam quem tinha filho, que filho chorava, tinha doença. Quando saí, disseram que eu só arrumaria uma bruxa para casar.

ÉPOCA - Qual vai ser o último capítulo?
Brolezzi -
Sobre o sentido da vida. Quero dizer que ninguém sabe qual é o sentido e é preciso se acostumar com isso. O sentido da vida não está escondido com algumas pessoas, é você quem vai dar. Para mim, é ficar com a minha mulher, olhando revista e planejando a casa que a gente vai construir. O que importa é tomar sua história nas mãos e ter a memória apaziguada.
#Q:Pais versus filho numerário:#



'Roubaram meu filho'
Mãe de numerário, Elizabeth Silberstein lançou um manual de alerta às famílias católicas contra 'a falsa obra de Deus'

'Meu filho tinha 14 para 15 anos quando foi a um centro cultural do Opus Dei para fazer um curso de Redação. Foi convidado por um amigo do colégio. Apitou (tornou-se oficialmente numerário da Obra) aos 24 anos. Tinha acabado de levar o fora de uma namorada. O pessoal do Opus ligava 15 vezes por dia para a nossa casa. Pensei que eram amigos bacanas preocupados com o sofrimento dele. Quando falou que havia se tornado numerário, começou a chorar muito, e eu lhe perguntei por que não tinha nos contado antes. Ele disse que nós não entenderíamos. Essa é uma das frases-chave que eles põem na cabeça dos meninos. Para eles, os pais são os demônios que querem tirar a vocação. Em qualquer ordem da Igreja Católica, os seminaristas passam por vários testes para ter certeza da vocação. No Opus, ela é imposta. Eu propus ao diretor que meu filho passasse um ano de experiência, sem abandonar as atividades normais. Ele respondeu que eu tinha toda a razão e imediatamente o mandou para um retiro. Depois disse que lá não havia telefone. Eu e o pai dele fomos à polícia, descobrimos o telefone e chegamos ao retiro. Depois o diretor do centro ligou pedindo desculpas por ter mentido que não havia telefone onde meu filho estava. Quando entendi o que era ser numerário do Opus, chorei cinco anos sem parar. Tive o diagnóstico de depressão pós-traumática. Faz quatro meses que levantei. Aí disse: 'Chega'. E resolvi escrever o livro. Se eu evitar que uma única família passe pelo que passamos, já valeu a pena. A gente se prepara para não perder os filhos para as drogas e para a violência. Ninguém se preocupa em perder o filho para a religião.'


'Meus pais precisam rezar'
O numerário Augusto Silberstein diz que a família tem ciúme da Obra e frustração porque ele entregou a vida a Deus
Aos 29 anos, no Opus Dei há cinco, Augusto Silberstein faz pós-graduação em Administração e é subdiretor de um centro no Rio. Deu a seguinte entrevista a ÉPOCA.

ÉPOCA - Você acha que seus pais estão errados ao criticar a Obra?
Augusto Silberstein -
Meus pais têm uma apreciação errada da realidade por causa da paixão. É como usar óculos escuros. Se você põe um, tudo o que enxerga é escurecido. Eles têm de tirar os óculos para enxergar o lado bom da Obra, que é uma instituição maravilhosa. Me incomoda quando apresentam o Opus Dei assim porque parece que eu sou um fanático. Mas amo meus pais de coração. Acho que, como eu, meus pais têm de rezar.

ÉPOCA - Mas por que você acha que eles enxergam dessa maneira?
Silberstein
- Ciúme é uma das paixões. Imagine que você gosta muito de uma pessoa e se casa com ela. Aí entra a sogra. Ela vê que o filho está apaixonado, que uma pessoa está roubando o filho dela. Mas não é verdade. Também há uma certa frustração por eu não ter seguido o script que eles queriam. No meu caso, resolvi entregar minha vida a Deus.

ÉPOCA - Como você lida com o cilício?
Silberstein -
O cilício aparentemente choca, parece absurdo, medieval. Mas o Opus aproveita uma série de coisas antigas numa realidade nova. Acho que as pessoas não se escandalizam por causa da dor, porque hoje elas se submetem a coisas que provocam dor e que são desagradáveis só para ficar bonitas. O que escandaliza as pessoas é fazer algo desagradável por Deus.

ÉPOCA - Como é seu cotidiano? Com relação a livros e filmes, por exemplo?
Silberstein -
Como qualquer pai de família preocupado com a formação, a Obra tem de se preocupar com que não entre bobagem na cabeça dos filhos. Um numerário não pode ir ao cinema, mas não quer dizer que cinema seja bobagem. A gente assiste a filmes nos centros.

ÉPOCA - Qual foi o último filme que viu?
Silberstein -
Batman! É ótimo.

ÉPOCA - E livros?
Silberstein -
Livro que fala mal da Igreja, que te deixa deprimido, não pode. Nos centros há bibliotecas com bons livros.

ÉPOCA - O que está fora não é aconselhável?
Silberstein
- Exatamente.

ÉPOCA - Quais os autores que você sabe que não são bem vistos?
Silberstein -
(José) Saramago, por exemplo. Por que você vai ler uma coisa que fala mal do que você ama?



Os anos sombrios
Depois de mais de uma década na Obra, Thelma Pavesi luta para amarrar os pedaços da vida que deixou para trás

'Eu era uma das melhores da turma no curso de Química, da Unicamp. Namorava há sete anos, pretendia me formar e casar. Fui convidada por uma colega para assistir aulas de doutrina católica. Fui apenas para ser simpática. E continuei freqüentando por causa da insistência da moça que me 'tratava', é assim que eles dizem. Ela era responsável pela 'moça de São Rafael'', como chamam a garota que tem chances de 'apitar', entrar para a Obra. No caso, eu.

Essa pessoa faz um levantamento sobre a sua vida, situação financeira, profissional, amorosa. Ela foi entrando na minha intimidade até perguntar se eu era virgem. Se não fosse, seria um critério para desistirem de mim. Para apitar, eles criam uma crise vocacional. Dizem: 'Deus te chama. E chama só uma vez''.

Chegou a um ponto em que eu não conseguia mais trabalhar, comer, dormir porque Deus esperava a minha resposta. Fui instruída a desmanchar o namoro. Quando finalmente apitei senti alívio porque fiz o que esperavam de mim. No dia seguinte passei por um enorme arrependimento, mas já tinha dado a minha palavra a Deus. Se desistir você é uma traidora, uma Judas, é inferno certo.

Exerci lá dentro diversos cargos, comandei casa de retiro, tive de deixar meu emprego de professora. Cuidei da parte financeira, embora não faça a menor idéia de para onde vai o dinheiro. A TV ficava chaveada. Fiz coisas como colar um vestido sobre as pernas da Ivete Sangalo, no jornal, que era sempre censurado. Fui ensinada a olhar para um homem como se fosse uma espiga de milho. Quando não suportei mais e disse que queria ir embora, me ofereceram remédio. Já estava em uma casa em que a maioria tomava medicamentos com tarja preta. Entrei em depressão. Fiz tratamento. Quando melhorei, comecei a pensar em como arranjar dinheiro para ir embora, já que meu cheque, cartão e passes ficavam retidos pela Obra. Consegui um jeito de fazer caixa dois e juntei um dinheirinho. Encontrei um quartinho para alugar e me mudei. Saí há três anos, no dia da missa em homenagem ao fundador. A primeira coisa que eu fiz foi ir ao cinema. Entrei num filme qualquer, nem me lembro qual, mas adorei a sensação de liberdade. Eu tinha pedido no meu aniversário para assistir ao filme 'Uma mente brilhante' (ganhador de quatro Oscars) e não permitiram. Hoje tenho 39 anos, estou sem namorado, sem emprego e lidando com o fato de talvez nunca ser mãe. Não vejo esses 13 anos no Opus como algo que eu precisava passar, mas como uma manipulação que não quero que se repita na minha vida.



Marcelo Rudini/ÉPOCA
CONTROLE O professor Renato da Silva teve seus arquivos violados pelos superiores
Invasão de privacidade
Renato da Silva foi expulso depois que o subdiretor violou seus arquivos e considerou um e-mail suspeito
'Entrei para a Obra em 1982, aos 17 anos. Estudava em uma escola católica e vi um panfleto sobre orientação profissional. Fui, sem saber que era do Opus Dei. Quando minha família soube, eu estava na Obra havia três anos. Em 1989, fui enviado para o sul e consegui emprego em uma universidade federal.

Professor universitário é uma posição estratégica e eles não tinham ninguém lá. Sou doutor em Ciência da Computação pela USP e sempre valorizei a Internet, mas notei que havia uma atitude hostil a ela. Começaram a baixar normativas dizendo que só haveria um computador por casa, que deveria ser desligado à noite e que ficaria em local público. Fiz um dossiê de 82 páginas e encaminhei à comissão regional questionando as regras. Jamais pensara em sair da Obra. Como aprendi: ''Meu lugar é aqui, para o bem ou para o mal'. Mas em 2003 fui ao Rio a trabalho. Quando voltei, o subdiretor me disse: 'Na sua ausência, fiz uma coisa que não deveria ter feito, mexi nos seus arquivos e achei um negócio que levei ao diretor'. O diretor falou: 'Isso é tão sério que eu encaminhei à comissão regional e eles decidiram que é grave, você está confuso e não deve mais ficar aqui.' Perguntei o que poderia ser. Não me disseram. Não sabia para onde ir, depois de 21 anos vivendo em um centro do Opus. Lembrei do Jean (Lauand, hoje também dissidente), que era numerário mas morava sozinho. Passamos a noite em claro conversando. Entrei em depressão e tive que fazer tratamento. Hoje, aos 40 anos, concluí que você passa por um condicionamento muito forte, baseado na culpa. Segundo os psicólogos, é lavagem cerebral. Só depois descobri porque havia sido expulso. Era um e-mail, rascunho de um texto com perguntas incômodas para o diretor espiritual. Eu mal tinha lido, não tinha dado muita importância.'




Opus Dei: o sofrimento das "domésticas" da organização

revista epoca

06/07/2007

por Eliane Brum

O fundador do opus dei, o espanhol Josemaría Escrivá de Balaguer, costumava dizer que a espiritualidade é mais importante que a sabedoria para quem deseja se entregar a Deus. É o preceito de número 946 de seu livro mais popular – Caminho. Escrivá fazia uma ressalva: “Quanto a elas (as mulheres), não é preciso ser sábias; basta que sejam sensatas”. A baiana Rosidalva Julião afirma que não era uma mulher sensata quando ingressou num centro do Opus Dei para lavar, limpar e fabricar os instrumentos de martírio corporal usados pela controversa organização da Igreja Católica.

 REFÉM
Rosidalva Julião diz que o Opus Dei isola as numerárias auxiliares, 
responsáveis pelos serviços domésticos, para que não consigam sair

Em menos de dois anos, ex-integrantes e familiares de membros ativos do Opus Dei publicaram seis livros no Brasil. A mais recente ofensiva editorial revela a vida cotidiana das mulheres entre as paredes da Obra de Deus, tradução da expressão latina Opus Dei. Rosidalva é a personagem real de dois títulos: O Opus Dei e as Mulheres (Panda Books) e Sob o Jugo do Opus Dei – este último lançado no fim de junho. Seu depoimento ilumina, pela primeira vez, uma figura obscura da organização. Rosidalva era numerária auxiliar, única categoria restrita ao sexo feminino.

Dois tipos de membros vivem em centros do Opus Dei: os numerários e as numerárias auxiliares. Os homens são separados das mulheres. Os numerários são leigos celibatários de ambos os sexos. Têm curso superior, e a maioria desempenha suas atividades em postos estratégicos da sociedade. A força do Opus Dei é, segundo os preceitos, “a santificação no meio do mundo”. No Brasil, a organização começou a atuar no fim dos anos 50. Boa parte dos primeiros numerários foi recrutada entre os melhores alunos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.

As numerárias auxiliares, não. De origem humilde, elas são recrutadas em zonas rurais e nas periferias das grandes cidades. Na prática, são as domésticas do Opus Dei. Com algumas diferenças. Não podem casar, namorar nem fazer sexo. Sua carteira de trabalho é assinada pela secretária ou administradora do centro. Ao ingressar na Obra, a aceitação das regras é automática. Uma delas é doar o salário. Como a própria organização as remunera, elas vivem uma situação ambígua: nem sequer chegam a receber o dinheiro e passam a depender da administração para todas as suas necessidades.

“Eu era uma escrava”, afirma Rosidalva. 
 “Diziam que meu salário era para Deus. Mas eu tinha de assinar os recibos.”
 
Ela foi recrutada aos 20 anos, no ponto de ônibus. Havia acabado de chegar a São Paulo, vinda de Salvador. Esperava conseguir um emprego e terminar o ensino médio para fazer faculdade de Fisioterapia. “Conheci uma auxiliar no ponto de ônibus. Ela disse que trabalhava num lugar maravilhoso, que eu iria lidar com administração e poderia estudar”, diz Rosidalva. “Depois de seis meses, eu queria ir embora, mas insistiam que Deus tinha me escolhido e que eu estava virando as costas. Era uma pressão terrível. Eu não queria ter vocação, mas afirmavam que eu tinha. Jesus Cristo era meu amigo. Virou meu patrão.”

Quando precisam de um médico ou dentista, as auxiliares são encaminhadas a profissionais ligados à Obra. Em geral supernumerários – a categoria dos membros casados. Elas raramente saem à rua. Quando isso acontece, costumam ser acompanhadas. Não podem ir ao cinema. Só lhes é permitido ler os livros autorizados pela instituição. Jorge Amado e José Saramago, por exemplo, são escritores vetados pelo Opus Dei. A TV é trancada a chave.

Uma vez por semana, as auxiliares são submetidas à “conversa fraterna”. No ritual contam à “diretora espiritual” tudo o que pensaram e sentiram, usando o que o fundador chamava de “sinceridade selvagem”. São aconselhadas, como os demais numerários, a começar sempre pelos “sapos mais gordos”. “Em duas ocasiões, fiz as malas para ir embora, mas tive de desfazer”, diz Rosidalva. “Não tinha nenhum dinheiro, não conhecia ninguém fora do centro e minha família estava longe.”

No Sítio da Aroeira, no município paulista de Santana do Parnaíba, as numerárias auxiliares são responsáveis também pela fabricação de instrumentos de martírio corporal: o cilício – uma tira de arame com pontas usada no alto da coxa durante duas horas por dia – e as disciplinas – um chicote de corda trançada usado para açoitar as nádegas nuas uma vez por semana. “Para fazer o cilício, é preciso cortar os arames com um tipo de alicate de bijuteria. Como no início eu não sabia fazer direito, sem querer cortava enviesado. Aí machucava mais, porque ficava pontudo, entrando mais na carne”, diz Rosidalva. “O padre elogiou esse fato e pediu à diretora para me dizer que estava muito bem-feito. A orientação era experimentar o cilício depois de pronto. Se não machucasse, era necessário desmanchar e refazer.”



O uso do cilício e da disciplina é a característica que mais instiga a imaginação do público no que se refere ao Opus Dei. O objetivo da mortificação corporal é evocar o sofrimento de Cristo para fazer a caridade. Pode parecer estranho que, no século XXI, uma organização formada em sua maioria por profissionais liberais e acadêmicos use instrumentos de martírio. No Ocidente, porém, o respeito à autonomia do indivíduo é uma conquista de toda a sociedade. No Estado laico, toda escolha deve ser respeitada, desde que não viole a lei. Apesar de a Igreja Católica criticar o que considera um excesso de liberdades individuais no mundo moderno – especialmente quando se trata de escolhas na área da moral sexual –, as práticas de qualquer um de seus fiéis são merecedoras do direito à tolerância garantido a todas as fés.

A crítica de alguns dissidentes é que não escolheram seguir regras como a mortificação corporal. Além de produzir o cilício e as disciplinas, as numerárias auxiliares também são obrigadas a usá-los. “Por fazer cilícios e hóstias, fiquei com tendinite”, afirma Rosidalva. “Por usar o cilício, tenho até hoje pontinhos brancos nas coxas.”

Aos 32 anos, casada e com um filho pequeno, ela diz ter decidido escrever o livro “para conseguir viver”. “O Opus Dei era como uma infecção dentro de mim. Bloqueava toda a minha vida. Consegui um emprego de camareira de hotel. Quando fui arrumar os quartos, paralisei. Não conseguia me mexer, porque me lembrava dos centros. Fiquei desempregada”, diz. “Logo que saí, tinha pesadelos recorrentes. Sempre estava presa em um quarto quando começava a encher de água, pegar fogo ou ser invadido por ratos e baratas. Agora, botei tudo para fora e quero esquecer.” Hoje, Rosidalva é secretária de uma paróquia católica, em São Paulo.

ATAQUE EDITORIAL 
Os dois últimos lançamentos mostram o cotidiano das mulheres entre as paredes da Obra


Guerra de mães
Rosidalva divide as páginas do livro Sob o Jugo do Opus Dei com Josefa Rodrigues – mãe de uma numerária auxiliar. Desde o ano passado, Josefa e o marido, Francisco, movem uma campanha pelo site Orkut, chamada “Opus Dei – Libertem Taís!!!”. Filha do meio do casal, Taís foi levada a um centro do Opus Dei aos 17 anos para trabalhar. “Não sabíamos o que era Opus Dei. A Taís estava terminando o ensino médio e estávamos desempregados. A diretora do centro ligou perguntando se ela não queria fazer uma experiência. Quando surgisse um emprego melhor ou ela pudesse fazer faculdade, sairia”, diz Josefa. “Achei ótimo, porque estava em um lugar seguro, da nossa Igreja, que sempre foi referência para tudo na nossa vida. Então, autorizei.”


Taís nunca mais saiu. Hoje tem 23 anos e tornou-se numerária auxiliar. “Minha filha desistiu de fazer faculdade, afastou-se da família, virou um zumbi. Só então começamos a investigar e descobrimos o que era o Opus Dei. Ficamos horrorizados, mas já era tarde”, diz Josefa. “Não tenho nada contra ser empregada doméstica, mas não acredito que alguma mãe deseje esse futuro para sua filha. Ninguém escolhe essa vocação. A gente é pobre, mas hoje pobre chega à faculdade. Até entrar no Opus Dei, a Taís era uma ótima aluna e queria estudar.”

Francisco é caseiro de um sítio no município paulista de Itupeva. Ganha R$ 600 por mês. Em abril de 2006, comprou um computador em 18 prestações de R$ 120. Com a ajuda da filha caçula, ele e a mulher transformaram a internet numa arma. Mantêm ativa no Orkut a comunidade usada para denunciar o Opus Dei. Enviaram e-mails a todos os bispos do Brasil, ao Núncio Apostólico e até para a Embaixada do Brasil no Vaticano. “Imagina eu, um jardinheiro que não sabe nem falar. Agora estou no Orkut, no MSN”, diz Francisco.

O Opus Dei gerou algum barulho no início de sua história. Escrivá fundou a organização em 1928 e apoiou a ditadura franquista na Espanha. A Obra passou a maior parte de seus quase 80 anos aumentando sua influência na Igreja Católica sem chamar a atenção do mundo. Só ficou conhecida do grande público a partir de 2003, ao se tornar tema de um dos maiores best-sellers de todos os tempos – O Código Da Vinci, de Dan Brown. Mas esta era uma obra de ficção. A série de livros de não-ficção só foi possível no Brasil por causa da internet.

 Acima, um bilhete em que a garota diz para quem dedica suas mortificações 


Em 2003, um grupo de ex-numerários tomava chope e comia frango à passarinho no Senzala, tradicional bar de São Paulo, quando decidiram montar o site www.opuslivre.org. “A partir daí, o que era individual tornou-se coletivo.

Pessoas separadas pela distância e pelo tempo se encontraram na rede e descobriram que sentiam as mesmas coisas, tinham os mesmos problemas”, diz o ex-numerário Márcio Fernandes da Silva. Ele é um dos três autores de Opus Dei: os Bastidores (Verus Editora), o primeiro livro contra a Obra, lançado em 2005. Hoje, além do site, os dissidentes compartilham confissões em comunidades do Orkut. Uma delas, a “Opus Dei Brasil”, tem quase 800 membros.

A internet uniu Josefa, Rosidalva e Betty Silberstein – a primeira mãe de um numerário a denunciar publicamente os meios de recrutamento da Obra. Betty escreveu uma espécie de manual, em 2005 – Opus Dei – A Falsa Obra de Deus – Um Alerta às Famílias Católicas. Organizou também o último lançamento, Sob o Jugo do Opus Dei. Ela e o marido, administrador de empresas, bancaram a edição de ambos. “Os centros não têm placas dizendo que são do Opus Dei. Crianças e adolescentes são levados pelos pais ou por amigos porque oferecem atividades educativas, recreação, palestras. Sabemos apenas que é algo da Igreja Católica. E por isso confiamos”, diz Betty. “Escrevo porque, se tivesse alguma informação, meu filho jamais teria entrado num centro. É nosso dever de mãe saber aonde estamos levando nossos filhos de 14, 15, 16, 17 anos.” No final de cada livro, ela publica todos os endereços dos centros para que os pais possam descobrir se o local freqüentado pelos filhos pertence ao Opus Dei.

Betty e Josefa uniram-se a outras mães de numerários – poucas ainda – para formar o “Grupo de mães de famílias prejudicadas pelo Opus Dei”. Acompanharam, empunhando faixas, os eventos públicos da visita do papa Bento XVI, em São Paulo e Aparecida. “Fomos atraiçoadas pelo que mais amamos na nossa vida, a nossa fé católica”, diz Josefa. As mães entregaram uma carta aberta aos bispos reunidos na 5a Conferência-Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe, em maio. Nela, pediam a criação de “um grupo de trabalho” para tratar “dos casos em que famílias solicitam apoio e socorro no conflito com o Opus Dei”.

Quando levaram seus filhos a centros da Obra, eles eram menores de idade. Hoje, têm mais de 18 anos e declaram querer permanecer na instituição. Quando Taís não voltou para casa, Josefa e Francisco, católicos praticantes, não tiveram dúvidas sobre o que fazer. “Fomos pedir ajuda ao bispo”, diz Josefa. A pedido dos pais, dom Gil Antônio Moreira, bispo de Jundiaí, conversou com Taís. “Ela disse a dom Gil que está feliz no Opus Dei”, afirma o padre Jorge Demarchi, coordenador da pastoral de comunicação da diocese. “Ele não notou nada de estranho nela. Se a moça é maior de idade, o que mais o bispo pode fazer?”

 As mães esperam da Igreja Católica que obrigue o Opus Dei a ter “transparência no processo de recrutamento” e investigue os meios de “descoberta da vocação”. “O Opus Dei é como o traficante na porta da escola”, diz Betty. “Sem contar que, em todas as congregações, os seminaristas passam por vários testes para ter certeza da vocação. Na Obra, ela é imposta.”

O Opus Dei, procurado por ÉPOCA por meio de seu escritório de comunicação, em São Paulo, não quis dar entrevista. Taís, a filha do casal Josefa e Francisco, marcou entrevista para as 18 horas do dia seguinte ao primeiro contato. No horário marcado, disse que não iria falar. Ela vive em um centro no Paraná.



A voz dos bispos
O Opus Dei é a única prelazia pessoal da Igreja Católica. Esse status o torna mais influente que qualquer um dos movimentos conservadores aninhados no amplo regaço do catolicismo. Como prelazia, o Opus Dei não tem limite de território. Circula na sociedade mundana protegido pelo escudo milenar da Igreja Católica. Mas só responde a seu prelado, hoje dom Javier Echevarría. E ele só presta contas ao papa. Por esses privilégios especiais, concedidos à organização pelo papa João Paulo II, em 1982, seus inimigos costumam dizer que o Opus Dei é “uma igreja dentro da Igreja”.

Seu fundador, Josemaría Escrivá, foi canonizado em 2002, menos de 30 anos depois de sua morte, período rápido para a média na Igreja Católica. Basta lembrar que Frei Galvão, o primeiro santo brasileiro, morreu em 1822 e só foi canonizado neste ano – quase dois séculos mais tarde. Ter sido liderada por “santos” parece ter virado uma meta no Opus Dei. A causa de canonização do sucessor de Escrivá, monsenhor Álvaro del Portillo, falecido em 1994, já foi oficialmente aceita em Roma.

A maioria dos dissidentes da Obra se mantém católica. E vem aumentando a pressão para que a cúpula da Igreja tome uma posição diante de suas denúncias. “Afinal, somos ou não parte do rebanho? Quando temos um problema dentro da Igreja, a quem devemos recorrer?”, diz Betty. “Acho que não é ao rabino ou ao bispo da Universal.”

ÉPOCA enviou a dom Dimas Lara Barbosa, secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, o relato dos sucessivos pedidos de providências aos bispos e à CNBB feitos por Josefa Rodrigues e pelo grupo de mães. Em 27 de junho, dom Dimas respondeu com uma nota de 11 itens – oito deles explicavam o que é uma prelazia pessoal. No nono, dom Dimas declarava: “Em outras palavras, a CNBB não tem nenhuma autoridade para interferir nos assuntos internos do Opus Dei”.

Por considerar as denúncias “graves”, dom Dimas deu instruções precisas: as mães devem “recorrer diretamente à Congregação para os Bispos ou ao Tribunal da Rota Romana, ambos em Roma. Para isso, convém consultar um advogado especialista em Direito Canônico, disponível no Tribunal Eclesiástico mais próximo”.

Uma semana depois, na terça-feira passada, dom Dimas procurou ÉPOCA para explicar que teve tempo para conversar com alguns colegas e queria fazer uma “pequena modificação” na nota. Dom Dimas retirou a referência à gravidade das denúncias e acrescentou: “O processo de discernimento vocacional na prelazia é prolongado e cuidadoso e, pelo que me consta, marcado por um profundo respeito à liberdade das pessoas, de modo que só cheguem a formalizar seu compromisso estável aqueles e aquelas que tenham demonstrado maturidade suficiente e plena convicção do caminho que escolheram no seguimento de Cristo. Além disso, conheço diversos membros do Opus Dei. São pessoas de excelente formação intelectual, espiritual e moral e grande dedicação apostólica, e que não demonstram minimamente os desequilíbrios de que se tem falado”.

Dom Dimas também declarou-se, por telefone, “provocado a chegar à verdade”. Disse que neste final de semana começaria a ouvir, no Rio de Janeiro, os filhos das denunciantes – ele ainda não sabia quem, exatamente. Também estaria disposto a conversar depois com o grupo de mães – “talvez dividindo a tarefa com dom Geraldo Lyrio”, atual presidente da CNBB. “Como trouxeram o problema à CNBB, me sinto no dever de aprofundar a questão”, afirmou dom Dimas. “É uma atitude de ajuda fraterna. Se percebermos que há alguma coisa errada na formação, vou falar com o superior da Obra para ajudar a resolver.”

Em 29 de maio de 2006, dom Geraldo Majella Agnelo, então presidente da CNBB, respondeu a Josefa por meio de sua secretária: “Informo que sua Eminência fez o devido encaminhamento do assunto aos órgãos responsáveis, pedindo que lhe seja dado uma resposta”.

ÉPOCA solicitou uma entrevista com dom Geraldo para esclarecer quais eram “os órgãos responsáveis” e se havia alguma resposta. Uma semana depois, dom Geraldo enviou a ÉPOCA a mesma nota de dom Dimas, “por estar inteiramente de acordo”. Só fez um adendo: “Acrescento somente o fato de as jovens que ingressaram no Opus Dei serem de maior idade. É tudo”.

Ex-membros do Opus Dei têm denunciado – insistentemente – que foram “pressionados e manipulados” para entrar na Obra. “Será que alguém tem vocação para lavar louça e limpar banheiro? Eu queria estudar”, diz Rosidalva.

Ela afirma só ter conseguido abandonar o Opus Dei depois de sete anos, em 2002. “Percebi que não adiantava continuar repetindo que não tinha vocação”, diz. “Disse à diretora que tinha mentido. Que não era casta antes de chegar à Obra, que tinha tido vários homens, era muito pior que Maria Madalena.”

Embora a diretora não conseguisse entender como Rosidalva havia sido escolhida, achou melhor liberá-la. “Me deram R$ 350 e me botaram na rua uma semana depois”, afirma. “Saí virgem como tinha entrado.”

No Opus Dei, ela só podia usar o uniforme azul ou roupas em tons pastel. No lançamento do livro, vestiu-se de vermelho. Rosidalva afirmou que agora é uma mulher não apenas sensata – mas sábia.



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